15/03/2018

CoR

Acordo e fico chateada pelo meu sonho ter sido demasiado barulhento, olho lá para fora e vejo que escureceu e fiquei adormecida no meio dos meus livros que ninguém teve coragem de me acordar nem mesmo o meu cão.
Tento adormecer novamente.
Afinal não, afinal o barulho não foi do meu sonho, e quando me preparava para ir ver a origem deste mesmo ouço um berro... paro, congelo e o meu instinto é pegar neste pequeno corpo e voltar para trás, ponho a música no máximo, acalmando o ser irrequieto e ao meu cão também.
A música já não está a abafar nada e apetece-me gritar, gritar para os gritos desaparecem mas nada sai da minha boca, como se o som estivesse silenciado. A minha porta abre com força e vejo preto, vermelho e muita falta de amor. A minha primeira vontade foi agarrar nela para não cair mas se fizesse um gesto qualquer iríamos ser espectadores do mesmo espetáculo de todos os dias, tirando quando o ator não está em cena, santos dias.

As minhas lágrimas já não caem, como se a fonte já tivesse secado.

Ele larga-a e julgo ver a sua desistência e em segundos o principal abandona a casa, os acontecimentos a seguir são rápidos e confusos mas tudo que sei é que enquanto a água do chuveiro lhe tenta limpar alguma coisa nem que seja a alma, eu guardo tudo em mochilas e tento pôr sorte lá para o meio. Procuro a minha caixa e vejo que quem arranjou este, arranja outra vez e meto também para a mochila.
A despedida é algo que imprevisível e tento acalmar e injetar coragem no ser frágil que de brilhante se tornou carvão, ganho coragem e fecho a porta depois de a ver desaparecer na rua e preparo-me para o que poderá vir e assim, ficou tarde demais para fugir.
A chave rodou. Ele entrou. Ele olhou à sua volta. Procurou e não encontrou.
Vejo o meu cão ser chutado para longe e tento esticar o braço até ele e só aí percebo que a minha visão está turva e reduzida e não consigo fazer nada: como sempre.
E sorrio porque desta vez a pintura foi feita noutra tela que não a mesma, estou quente e sinto a minha cabeça explodir e depois de aquecer o lugar no tapete da sala, deixo-me ir para um lugar calmo... Já não ouço berros, nem sinto o meu corpo ser abalado aliás, é como se já não estivesse ali realmente e com um último descarregamento...
Eu desisto.
E desejo sorte à minha mãe para ser pintada novamente com cores que ela realmente mereça.

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